quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Conto - Duque


Duque


               Antônio estava quieto, estático mesmo, pensando, sentado na beira da cama de colchão de palha. Não se mexia, olhar fixo em minha direção, olhos arregalados, sobrancelhas baixas e testa relaxada, contudo olhava-me mas não me via.

               - Antônio não é de muita conversa eu sei, mas..., pensou sua avó.
               - Menino bonito, esperto e com jeito de filósofo, sempre fazia perguntas profundas, o que será que houve? Por que está tão calado? Continuou a pensar D. Nilza,
               - Talvez, esteja com algum problema, ou será que brigou com o irmão e as primas?
Não deve ser nada de mais, ele está crescendo, sussurrou vovó Nilza.

Lembrou que precisava espiar o arroz que a essa altura cheirava muito bem, refogado com alho, cebola e um pouco de bicarbonato. Sem querer incomodar o momento de Antônio, então D. Nilza lentamente iniciou sua caminhada em direção a cozinha. A amável Sra. teve de desviar dos obstáculos que estavam postos no chão, pequenas e médias latas de azeite e óleo de cozinha, daquelas em formato quadrado, que mais pareciam veículos de carga, isso porque alguns estavam cortados com areia e terra dentro, havia também duas tampas de panela velha que Antônio e seu amigo Léo utilizavam como volantes de ônibus.

                - Sai, sai da frente, resmungou com firme voz D. Nilza.

Apesar de todos aqueles brinquedos que simulavam um grande canteiro de obra em poucos minutos D.Nilza descobriu a panela do arroz e começou a descascar os ovos para o almoço, que seria servido com chuchu cozido no louro, uma delícia.

                 A casa estava em silêncio, fato nada comum nessa época do ano, começo de janeiro durante as férias escolares, nesse tão esperado período do ano, os netinhos de D. Nilza passavam 10 dias em sua casa no interior, e claro ela adorava.

                - O que será que está acontecendo? Onde estão o Victor a Laura e a Raissa? Pensou a preocupada avó,
                - Bom vou terminar o almoço e logo procuro entender, afinal notícias ruins chegam à cavalo, disse em voz baixa a preocupada velhinha.

               Do lado de fora, na parte de traz do grande quintal da casa, os cachorros estavam calmos, sem a menor agitação, Kendal, a cadela matriarca da cachorrada estava deitada ao lado de Victor e Raíssa que velavam o pobre animal. Seu focinho estava pálido e com pouca umidade, suas orelhas estavam amassadas, principalmente a que estava entre a cabeça e o chão, apesar do retalho cor de vinho todo sujo, que forrava o chão.

               Victor parecia desolado, menino inteligente, aliás menino não, já tinha 14 anos, com muitas qualidades, talvez a mais evidente era sua boa vontade com todos, sempre tratava todos da família ou amigos da família com muito carinho. Nos últimos anos as visitas a sua avó ficaram mais raras, já que seu tempo de folga e férias eram preenchidos por bate papos cabeças com seus amigos adolescentes e longas horas em frente ao vídeo game. Entretanto este ano ele fez questão de passar mais uma férias com sua avó, em Ipiabas exatamente como fazia em sua infância. Ao seu lado estava Raíssa a prima predileta, mesmo que ele negue todos percebem o carinho que Victor tem por sua prima mais velha.

               Raíssa, é uma menina muito meiga, linda a jovem moça, sensível e doce, todos gostavam dela. Raíssa já não passava as férias em Ipiabas com sua avó, me parece que ela tinha um namoradinho no Rio, estava por aqui só para o fim de semana.

              Logo chegou Laura, e agachou-se próximo ao Victor, não disse nada, mas respirou profundamente, como estivesse se preparando para algum acontecimento forte. Laurinha, era a netinha caçula, menina sapeca de temperamento forte, com uma inteligência que seu tio comentara por diversas vezes como sendo uma menina a frente de seu tempo, isso porque ela pensava rápido e sempre de uma maneira assim, fora da caixa, acho até que ela é levada, mas também dócil e feliz.

Aproximei-me de Laura e logo ela me afagou a cabeça, imediatamente ajeitei o corpo para poder baixar minha cabeça em sua coxa, não entendi muito o porque daquele ar triste afinal, a Kendal não vai morrer, ou será que vai?

Kendal levantou o focinho como quem farejava algo, mas logo parou e me olhou tristonha, senti que devia fazer alguma coisa para ajudar, então levantei-me e fui em direção ao Antônio, subi os 8 degraus da escada da varanda atrás da casa que dava para cozinha, entrei correndo na casa e fui até o quarto que Antônio se encontrava. A essa altura Antônio parecia ter chorado, suas maçãs da face continham rastros de sujeira que desceram pelo rosto, parecia pequenos córregos negros e secos.

Antônio me olhou e perguntou,
                  - Será que a Kendal não vai superar o trauma e vai morrer?

Não entendi muito a pergunta mas infelizmente não pude responder, apesar de ter me esforçado em demostrar solidariedade com sinais corporais. Antônio então me abraçou e se levantou rapidamente, fui atras dele na esperança de que ele faria algo para tirar todos daquele clima de velório.

Ao chegarmos no quintal Antônio perguntou ao Victor,
               - E se arrumássemos outro filhote para a Kendal Irmão? Será que ela ficaria melhor?
               - Onde vamos arrumar outro filhote Tuninho? Pergunta Laurinha, com ar decisório.
               - Não sei, mas não podemos ficar aqui parados, vendo a Kendal tão triste, responde Antônio.

Victor se levanta, bate as palmas das mãos a fim de retirar a terra grudada, neste momento Kendal levanta a cabeça e discretamente abana o rabo, foi quando tive o estalo e comecei a imaginar como poderia reanimar a Kendal, talvez se brincássemos de jogar ossos com o Victor, Antonio e Laurinha, ou se fossemos todos correr na estrada do hotel lá no alto da colina em frente da casa como fazíamos antes, ou talvez brincar de caçar Jacus que pousam nas copas das árvores enquanto ficamos embaixo: a garotada finge de caçador e a cachorrada finge de cães de caça.

De repente Victor, grita...
                  - Vóóóó, o almoço já está pronto?
                  - Siiiiiim, podem vir, responde D.Nilza lá de dentro da cozinha.
                  - Nossa, eu estou morrendo de fome, diz Raíssa,

Laurinha levanta e corre em direção a casa sem nada dizer.

                 - Tuninho não fica assim, vamos almoçar, diz Victor preocupado com o irmão.

Antônio não responde, continua de cócoras olhando tristemente para Kendal.
Victor continua fitando o irmão por alguns segundos e chama Raíssa,
                 - Vamos almoçar Raíssa, fala Victor.
Os dois levantam e abraçados lentamente procuram o caminho da cozinha.

                Neste instante não tenho duvidas, o Antônio é o único que ama os cães de verdade, ele realmente está triste e preocupado com a Kendal por ter perdido os filhotes no seu oitavo parto.

Levantei-me e com os dentes agarrei o osso de borracha e levei até os pés do Antônio, ergui um pouco a cabeça abanando o rabo comecei a lamber o rosto do Antônio, que neste momento me abraçou apertadamente, e disse,

- pobre Duque.



São Paulo, 9 de janeiro de 2013.
Popi.

sábado, 5 de janeiro de 2013

Poema - Homenagem à Arte


Homenagem à Arte.
(Por Luís A. A de Oliveira)

Escrever poema é para muitos um dilema,
Representar e tentar protagonizar no dia a dia é humanamente imbecil, 
Porque castra a criança que nos acompanha até aos 80.
Arte é um forma de potencializar o benigno, 
Promover a cultura é expressar o que há de mais digno.

Artistas são cercados de conflitos,
São muitos os lamentos,
Nos palcos deste país cultivam nossa cultura,
E revelam a nossa criatividade com desenvoltura
À plateia emana, e energia assopra,
Sente alegria, tristeza, emoções diversas
Ninguém fala, ninguém diz, ri, chora.

Fazer música é dom divino, 
cantá-las é como agradecer aos deuses,
Aquelas vozes lindas de meninas, vozes femininas, 
Afinam os ignorantes e cativam os anjos.

Dourada seja ou pelo menos deverias ser
A vida de um dançarino,
Derrama-se nos palcos, com técnica e doçura para emocionar você,
Nobre, pobre, belo e feio, não importa o bailarino
A Dança, sintetiza, alcança, inclui e educa.

Escrever poema é para muitos um dilema,
O escritor admira o criador,
E o poeta cria orações com harmonia,
Abstratamente ou concretamente a vida imita a arte, 
Mas a arte sugestiona a vida.


São Paulo, 5 de Janeiro de 2013.











Música - Subitamente Só



"Subitamente só"
(Composição de Luís A. A de Oliveira)


Tantas razões para ficar ao seu lado,
mas assim mesmo não entendo o que está errado,
nossos olhos se encontram na rua de baixo,
aguardo seu momento escuto seu pulso,

hoje vejo como fui cego ontem, e a falta que você me faz,
sou rastro de um passado que rasga o amanhã 

Carros passam, meninas cochicham e quase aos gritos homens de ternos
fumo outro para tranquilizar meus anseios
chove muito no bairro mas garoa no inverno
não diga nada estou em prantos em seus seios

hoje vejo como fui cego ontem, e a falta que você me faz,
sou rastro de um passado que rasga o amanhã

mulheres criaturas batalhadoras e ansiosas,
lida com problemas incessantes, dia a dia intenso,
irresistível vontade de fundir nesse corpo,
sentir seu calor e umidade de mulher

hoje vejo como fui cego ontem, e a falta que você me faz,
sou rastro de um passado que rasga o amanhã

sou rastro de um passado que rasga o amanhã

sou rastro de um passado que rasga o amanhã

2 X


São Paulo,  05 de janeiro de 2013.



quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Meu amigo oculto



Meu amigo oculto

"O meu amigo oculto é," digo com um certo nervosismo afinal falar em público não está
entre minhas habilidades.

"É o Davi," grita alguém no meio da festa.

"Não, não é o Davi, ele é muito mais importante que o Davi."
Respondi rapidamente. O Davi foi mencionado porque no Natal do ano passado ele foi
meu amigo oculto, e naquela ocasião para confundir a todos que tentaram adivinhar o
meu amigo, disse que o amava, mas minhas palavras saíram como um trunfo para os
palhaços que não perdem oportunidade de caçoar dos outros.

"O meu amigo oculto é como a fonte do ribeirão que banha e refresca os meu dias toda
manhã." Ao terminar a frase os gritos no meu entorno sumiram, dando lugar a um
abafado silêncio, como se meus ouvidos tivessem cobertos com fones.

"O meu amigo oculto é como aquele passarinho que voa sobre as árvores rasteiras e
espalham as sementes por todo canto e caminhos que sigo todos os dias."
Não consegui conter as lágrimas, respirei fundo, prossegui...

"O meu amigo oculto é como o sol do alvorecer, traz a renovação de uma
nova página da vida, mas com a esperança de um lindo dia."

"O meu amigo oculto é meu filho Antônio!"


Essas seriam minhas palavras para meu amigo oculto, meu filho mais novo
Antônio Duarte de Oliveira, se conseguisse conter a emoção que sentia naquela noite de Natal.


Rio de Janeiro, 25 de dezembro de 2012.
Popi.